Seocader Retroper estava lá. Não para investigar, mas para atrapalhar. E, claro, conseguiu.
Nem todo jornalista é investigador. Alguns apenas confundem tudo e, sem querer, colocam uma quadrilha inteira atrás das grades.
A noite em que o Banespa "melhorou" seu atendimento
Era madrugada de 5 de julho de 1999, e a cidade não dormia. Eu também não. Não por heroísmo ou por um senso de dever jornalístico, mas porque acabara de ser demitido de mais uma redação. Por quê? Bom, aparentemente, jornalistas precisam checar fatos antes de publicá-los. Detalhe irrelevante, ao meu ver.
O Piorzinho, coitado, já estava entediado antes mesmo de eu abrir a boca para contar minha história. Ele bebia um café frio, olhando pra mim como quem repensava todas as escolhas que o levaram até aquele momento.
— Pensa só, Piorzinho — disse eu, mastigando um pão com ovo encharcado de nostalgia. — Você já tentou sacar dinheiro de madrugada?
— Nunca precisei — ele respondeu, desconfiado.
— Pois eu tentei! E, veja bem, o banco simplesmente se recusa a me deixar pegar meu próprio dinheiro! Isso não é um absurdo?
— …
— Mas sabe o que foi mais absurdo? O serviço que resolveram criar naquela noite. Organização impecável, atendimento ágil… Só que ninguém me avisou da novidade.
Foi então que contei como vi um grupo de pessoas entrando no Banespa, bem organizadas, de uniforme e tudo. Sacolas se enchendo de dinheiro. Um trabalho impecável. Só podia ser um novo sistema de saque emergencial!
Até que um deles esbarrou em mim.
— Que foi, otário? Quer levar uma bala?
Se eu tivesse um mínimo de inteligência, teria me tocado que estava no meio do maior assalto a banco da história do Brasil. Mas eu apenas pensei: “Nossa, que forma violenta de lidar com clientes insatisfeitos.”
— Deixa ele, mano — disse outro bandido. — O cara tá mais perdido que nota de dois reais.
E, para minha surpresa, ainda tentaram me "compensar" pelo transtorno.
— Aqui, tio. Compra um dogão.
Claro, eu recusei. Tenho meus princípios. E, convenhamos, ninguém saca dinheiro só pra comprar cachorro-quente.
Quando percebi tudo ao contrário
No dia seguinte, leio a manchete no jornal:
"ASSALTO AO BANESPA! QUADRILHA LEVA R$ 37 MILHÕES!"
Impossível. Eu estava lá! Era um serviço inovador, não um crime!
— Você é um gênio — ironizou Piorzinho.
Mas a coisa piorou. Sem querer, minha incompetência jornalística levou à captura dos bandidos. Meu relato atrapalhado chamou a atenção de um detetive que ligou os pontos. Uma investigação começou. E, três meses depois, a maioria da quadrilha estava atrás das grades.
O líder do assalto, um tal de Abnaldo Medeiros, foi pego na Bahia, num hotel barato, com uma Grand Cherokee e R$ 12 mil no bolso. Confessou tudo. Até contou que gastou R$ 1,8 milhão subornando policiais pra se safar.
Ou seja, enquanto eu achava que tinha testemunhado um serviço bancário inovador, na real, vi uma aula de crime organizado.
Pensei em visitar o cara na cadeia. Explicar que foi tudo um mal-entendido.
— Melhor não — aconselhou Piorzinho, com um olhar de quem não queria ter que me identificar no IML.
E assim, engoli seco meu café frio e segui com a vida. Afinal, a cidade continuava sem caixas eletrônicos funcionando de madrugada, e eu? Eu continuava entediado.
Biografia Histórica
O assalto ao Banespa em 1999 foi um dos maiores e mais ousados crimes financeiros da história do Brasil. Na madrugada de 5 de julho, uma quadrilha altamente organizada invadiu o edifício-sede do banco, localizado no centro de São Paulo. Vestidos como bombeiros, os meliantes conseguiram burlar a segurança e levar cerca de R$ 37 milhões. O caso ganhou destaque nacional não apenas pelo valor roubado, mas também pela audácia dos criminosos e pelas falhas no sistema de segurança do banco.
O líder da quadrilha, Abnaldo Medeiros, foi preso três meses depois na Bahia, após uma investigação que contou com a ajuda de relatos confusos de testemunhas, incluindo o do jornalista Seocader Retroper. Medeiros confessou o crime e revelou que parte do dinheiro foi usada para subornar policiais. O caso expôs falhas graves na segurança de instituições financeiras e levou a mudanças significativas nos protocolos de proteção de bancos no país.
Para mais detalhes sobre o caso, confira as reportagens da Folha de S.Paulo e do Diário do Grande ABC.
Nenhum comentário:
Postar um comentário